Wednesday, June 01, 2005

 

HPV Que Bicho É Esse?

HPV, QUE BICHO É ESSE?
HPV é uma sigla em ­inglês: Human Pa­pillomavirus que em por­tu­guês é Papilomavírus Humano. É um vírus que está sub­di­vi­di­do em mais de 100 tipos dife­ren­tes. Cada tipo rece­be um núme­ro, por exem­plo: 6, 11, 16, 18...
É rela­ta­do na ciên­cia médi­ca que ­alguns tipos são mais agres­si­vos (onco­gê­ni­cos) do que ­outros. É cita­do, ainda, que cada tipo pode cau­sar dife­ren­tes mani­fes­ta­ções clí­ni­cas. Assim, sabe­mos que os tipos 6 e 11 são mais cau­sa­do­res de con­di­lo­ma acu­mi­na­do ou ver­ru­gas geni­tais, popu­lar­men­te conhe­ci­das como “cris­ta de galo”. É típi­ca doen­ça benig­na.
Já os tipos 16 e 18 estão inti­ma­men­te liga­dos a ­lesões neo­plá­si­cas, com pos­sí­vel evo­lu­ção malig­na (cân­cer) nos geni­tais.
Embora seja muito fala­do que os HPV de alto risco (16, 18...) pos­sam cau­sar cân­cer no colo do útero e até no ânus, essa evo­lu­ção não ocor­re em todos os casos. Na ver­da­de, mesmo que se ins­ta­le uma lesão pré-malig­na tipo neo­pla­sia intrae­pi­te­lial, a pos­si­bi­li­da­de de regres­são da lesão é maior do que 50%. Todavia, ainda não é pos­sí­vel saber se uma alte­ra­ção vai ter cura espon­tâ­nea ou evo­luir para um cân­cer. A deter­mi­na­ção de um mar­ca­dor de evo­lu­ção será de valia ines­ti­má­vel, quan­do puder ser ampla­men­te usado em saúde públi­ca.
Sabemos, porém, que fuman­tes e por­ta­do­ras de ­outras infec­ções con­jun­tas no colo do útero, como her­pes e cla­mí­dia, ou por­ta­do­ras do HIV, estão mais sus­ce­tí­veis a evo­luir para casos seve­ros. É rela­ta­do, ainda, que pre­dis­po­si­ções indi­vi­duais, gené­ti­cas, para malig­ni­da­de, podem ace­le­rar tais pro­ces­sos. No entan­to, ainda não é pos­sí­vel detec­tar essas últi­mas alte­ra­ções, com os recur­sos cien­tí­fi­cos dis­po­ní­veis.
Trabalhando com a medi­ci­na por evi­dên­cia cien­tí­fi­ca, atual­men­te já se pode afir­mar que estu­dos gené­ti­cos com HPV demons­tra­ram que essas infec­ções pode­rão ­seguir três cur­sos:
– Apresentar-se como infec­ções tran­si­tó­rias, em cerca de 50% dos casos, com com­ple­ta eli­mi­na­ção do vírus, caso o orga­nis­mo este­ja imu­no­lo­gi­ca­men­te com­pe­ten­te.
– Determinar o apa­re­ci­men­to de ­lesões que, por sua vez, podem regre­dir espon­ta­nea­men­te em 30% a 50% dos casos.
– Evoluir para ­lesões que, mesmo após tra­ta­men­to, não con­du­zam à eli­mi­na­ção viral, esta­be­le­cen­do infec­ções per­sis­ten­tes, resis­ten­tes aos tra­ta­men­tos con­ven­cio­nais, as con­si­de­ra­das de alto risco para desen­vol­vi­men­to de cân­cer.
O HPV é um vírus muito dis­se­mi­na­do no mundo e, embo­ra seja pro­cla­ma­do como um vírus fre­qüen­te no ser huma­no, sua evo­lu­ção para cau­sar cân­cer é epi­só­dio raro. Todavia, como o número de pessoas infectadas pelo HPV, em todo o mundo, pode ser muito grande a transformação maligna pode ser um problema de saúde pública.
Existem bons estu­dos docu­men­tan­do que uma NIC – Neoplasia Intraepitelial Cervical (colo do útero) de grau leve, tem regres­são apro­xi­ma­da de 57% e tem pro­gres­são para cân­cer inva­si­vo em 1%. A de grau mode­ra­do, regri­de em 43% e pro­gri­de em 5%. Mesmo a de grau seve­ro ou acen­tua­do, que é con­si­de­ra­da um car­ci­no­ma in situ (não-inva­si­vo), pode regre­dir.
Em todos os está­gios de NIC há pos­si­bi­li­da­de de tra­ta­men­to efi­caz, e até sim­ples, evi­tan­do evo­luir para doen­ça inva­si­va.
Outro dado impor­tan­te é que nem tudo o que pare­ce é com cer­te­za.
Existem situa­ções em que um exame, prin­ci­pal­men­te o Papanicolaou (pre­ven­ti­vo), suge­re HPV; porém, na ver­da­de, não é HPV.
Por outro lado, há casos em que há HPV, mas ele está ali de pas­sa­gem, sem sig­ni­fi­car alte­ra­ções impor­tan­tes.
É impe­ra­ti­vo não se apa­vo­rar fren­te a um exame que mos­tre ser com­pa­tí­vel com HPV.
Acusar ­alguém de ter trans­mi­ti­do o HPV pode ser muito grave e até injus­to. Até por­que, o perío­do de incu­ba­ção do HPV pode ser inde­ter­mi­na­do. Alguns citam três meses, ­outros rela­tam anos. Ainda não está claro todo esse pro­ces­so. É pos­sí­vel, porém, que cada par­cei­ro ­sexual tenha adqui­ri­do o seu HPV de uma ter­cei­ra ou quar­ta pes­soa; se a sin­to­ma­to­lo­gia ocor­rer em ambos ao mesmo tempo, cria a pos­si­bi­li­da­de de acu­sa­ções ­mútuas.
De manei­ra geral, a infec­ção pelo HPV é conhe­ci­da como de trans­mis­são ­sexual; toda­via, encon­tram-se casos onde a difi­cul­da­de em esta­be­le­cer a forma de trans­mis­são é absur­da­men­te gran­de. A ques­tão torna-se mais com­pli­ca­da ainda quan­do ape­nas um dos par­cei­ros ­sexuais apre­sen­ta cli­ni­ca­men­te a doen­ça. A per­gun­ta: ‘Como e de quem ­peguei isso, dou­tor?’ É inva­ria­vel­men­te por mim res­pon­di­da: ‘Se eu pudes­se garan­tir, ganha­ria o Prêmio Nobel’.
Na expe­riên­cia de mui­tos pro­fis­sio­nais ocor­rem dúvi­das, tanto dos pacien­tes, como dos médi­cos e dos labo­ra­tó­rios, por­que o ser huma­no não é uma equa­ção mate­má­ti­ca única. Cada orga­nis­mo tem seu poten­cial para enfren­tar cada pro­ble­ma.
Uma con­du­ta sen­sa­ta, à luz do que sabe­mos hoje, 2005, pode ser: não super­va­lo­ri­zar uma hipó­te­se, achan­do que estar com HPV é sinô­ni­mo de que vai ter cân­cer; não acu­sar ­alguém de ter trans­mi­ti­do o pro­ble­ma; nem tam­pou­co negli­gen­ciar e achar que ele vai desa­pa­re­cer sozi­nho.
HPV é vírus que só aco­me­te o ser huma­no, poden­do real­men­te regre­dir e desa­pa­re­cer do orga­nis­mo. Com os conhe­ci­men­tos ­atuais, não é ver­da­de dizer que uma vez com HPV sem­pre com HPV.
Todavia, as pes­qui­sas já docu­men­ta­ram a sua par­ti­ci­pa­cão, prin­ci­pal­men­te, no desen­vol­vi­men­to do cân­cer do colo ute­ri­no. Porém, a afir­ma­ti­va seca de que HPV causa cân­cer, para mim, soa igual a dizer que árabe mul­çu­ma­no é ter­ro­ris­ta. Se, num avião, vai seqües­trá-lo e jogá-lo num arra­nha-céu. Tentar pro­mo­ver edu­ca­ção com medo pode não ser uma boa estra­té­gia. No geral, o medo passa.
Um pro­fis­sio­nal que não cause temor, que não indu­za a acu­sa­ções, que não peça um monte de exa­mes des­ne­ces­sá­rios, que não mande o par­cei­ro ­sexual fazer exa­mes sem antes ter a cer­te­za de que real­men­te a doen­ça exis­te, será deci­si­vo na con­du­ção sere­na e segu­ra dos casos.
Uma pes­soa bem escla­re­ci­da, com algu­ma capa­ci­da­de crí­ti­ca e com bom senso, será capaz de iden­ti­fi­car cada peça desse cená­rio.
Finalizando, desejo comentar fatos bem recentes: a vacina para HPV.
Fo­ram pu­bli­ca­dos, abril deste ano, re­sul­ta­dos de va­ci­na com for­mu­la­ção de par­tí­cu­las não-in­fec­tan­tes de qua­tro ti­pos de HPV li­ga­dos às le­sões ve­ge­tan­tes e ver­ru­co­sas – con­di­lo­ma acu­mi­na­do (6 e 11) e le­sões epi­te­liais do co­lo ute­ri­no de pos­sí­veis evo­lu­ções pa­ra cân­cer (16 e 18) em que a re­du­ção da in­ci­dên­cia com­bi­na­da des­sas al­te­ra­ções te­ve su­ces­so de 90 por cento.
Cir­cu­la no meio cien­tí­fi­co que, em um ou dois anos, se­rá pos­sí­vel ter uma va­ci­na qua­dri­va­len­te (en­vol­ven­do os qua­tro prin­ci­pais ti­pos de HPV – 6, 11, 16 e 18) pa­ra uso nas po­pu­la­ções bra­si­lei­ra e mundial. Is­to por­que os es­tu­dos es­tão sen­do fei­tos no Bra­sil e vá­rios ou­tros países.
Ca­be des­ta­car que quem mais es­pe­ra ser be­ne­fi­cia­do por uma va­ci­na des­se ti­po são as pes­soas se­xual­men­te ati­vas que não es­tão in­fec­ta­das com o HPV e pes­soas ain­da sem ati­vi­da­de se­xual ou no iní­cio da vi­da sexual. Pois, as­sim, será pos­sí­vel de­sen­ca­dear pro­te­ção pa­ra uma fu­tu­ra infecção.
Manter-se bem informado e exercer toda a sexualidade com responsabilidade sempre será uma conduta adequada.


Mauro Romero Leal Passos
Professor Adjunto Doutor Chefe do Setor de DST da Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ. www.hpvquebichoeeesse.com.br - www.uff.br/dst

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